sexta-feira, 30 de novembro de 2012


Assunto: ENC: Enc: JORJÃO E A LEI MARIA DA PENHA..

 



 

 

 

 

   

 

    Se havia algo que deixava o delegado Carlos Henrique consternado era choro de mulher. Ainda mais quando ela tinha 30 anos, era bonita e sensual:

    - Mas, o que foi que aconteceu, meu anjo? Conta pra mim... Maristela - esse o nome da vítima - fez beicinho:

    - Ele me bateu!!!....... Dr. Carlos Henrique trincou os dentes:

    - Ele, quem?

    - O Jorjão! ( Ele sentiu o peito arfar:)

    - E quem é esse Jorjão?

    - É... Bem, como eu posso dizer? Ah, deixa pra lá, doutor. Acho melhor não registrar nada.  Dr. Carlos Henrique pousou a mão naquele ombro macio, carnudo:

    - Posso lhe dizer uma coisa? (Maristela ficou em silêncio). O delegado insistiu:

    - Com toda a experiência que tenho nesses casos? Ela balançou a cabeça, afirmativamente:

    - Pode!

    - Se você não denunciar esse patife, ele vai te bater de novo. Ela abriu o olho roxo:

    - O senhor acha?

    - Tenho certeza, meu doce... Alisou o hematoma:

    - Aliás, vou expedir uma guia para o Instituto Médico-Legal fazer o exame de corpo de delito. Está horrível... Apesar dos pesares, ela sorriu:

    - O senhor ainda não viu nada.

    - Ele fez pior ainda? Maristela pôs a mão na coxa:

    - Me deu um chute aqui... - Ficou a marca?

    - Uma mancha enorme.

    - Entre aqui no meu gabinete, que eu quero ver.

    - Então, feche a porta, doutor. Dr. Carlos Henrique deu três voltas com a chave e mais quatro com o ferrolho. Tapou o buraco da fechadura com uma fita adesiva:

    - Assim está bom?

    - Ótimo. Agora, ligue o ar e prepare uma bebida para nós dois.

    - Vinho? Maristela mordeu o lábio ferido e exigiu:

    - Se tiver uísque, eu prefiro.

    - Tenho sempre um litro guardado para essas emergências, meu anjo. Puro ou com gelo?

    - Puro. O delegado serviu duas doses. Maristela pegou a sua e bebeu tudo em apenas três goles. Estalou os beiços:

    - Vou tirar a roupa.

    - Mostra tudo, meu doce. Quero ver todos os hematomas.

    - Apague aquela luz ali. Deixa só a do corredor... Dr. Carlos Henrique estava arrepiado: 

    - Isto aqui tá parecendo estúdio da Playboy... Tira tudo, meu anjo, tira.

    - Tô tirando... Pronto! O delegado, nervoso:

    - Preciso acender. Quero ver de perto para poder descrever nos autos...

    - Epa!!!!

    - O que foi, doutor?

    - VOCê é HOMEM, CARA !!!!

    - POIS é DOUTOR, É COM ISSO QUE O JORJÃO NÃO SE CONFORMA!

 

 

 

 

 

sexta-feira, 16 de novembro de 2012


BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXIII

                      José Augusto de Castro e Costa

 

O  então  novo programa do governo brasileiro trouxera, nos idos de 1903, novas e esperançosas perspectivas aos revolucionários acreanos, para quem havia justificativa de  sonhar que “o sol da liberdade em raios fúlgidos brilhou no céu da pátria nesse instante”.

No que tange ao Barão do Rio Branco, o mundo o vira dar nova orientação à política exterior do Brasil, o que o levara  a elaborar o famoso Tratado, destinado a  dirimir a secular contenda de limites com a Bolívia.

Quando  o Ministro José Maria da Silva Paranhos Junior assumiu a direção da política exterior brasileira, a luta, a qual os antecessores do eminente chanceler, por pura displicência, haviam  posto como encerrada, atingira a sua fase máxima, num conflito que chegara às proporções de uma guerra, cuja gravidade o governo do Brasil não poderia ficar alheio, no interesse da paz sul-americana. O ponto preocupante era, indubitavelmente, o arrendamento feito ao Bolivian Syndicate of New York, em cuja imensidão encontrava-se a zona mais rica, mais próspera e mais produtiva, que o destemor do acreano  povoara, civilizara e explorara, há muitos e muitos anos, até 1897, mansa e pacificamente.

Ao  dedicar-se à solução da questão do Acre, o Barão do Rio Branco sempre estivera ciente de que seu empenho não resumia-se apenas à Bolívia mas, sobremaneira à oposição política brasileira, onde o conflito de ideias refletia características de formação intelectual diversificada, destacando-se de um lado a ótica jurídica e de outro a social e patriótica, ou seja, o espírito do Direito versus o da Diplomacia, com a torcida das conveniências imediatistas.

Envolvido nesse clima, Barão do Rio Branco, em perfeita sintonia com o embaixador brasileiro em Washington, Assis Brasil, estudara com profundidade os antecedentes históricos, com a visão aguda dos fatos e deduzira que, na questão em apreço, sua preferência seria pelo acordo direto, o que resolveria as dificuldades presentes. Nascera dessa deliberação, o instrumento diplomático denominado Tratado de Petrópolis.

Para o Barão do Rio Branco e o Embaixador Assis Brasil, era preciso a todo custo que o Acre fosse, o mais rápido possível, incorporado ao Brasil. A questão acreana não era, para eles, uma questão amazônica, mas, sem dúvida, uma questão brasileira. E o mais importante, para a busca da solução, era o apoio e a dedicação do Presidente Rodrigues Alves, que expressava ponderações sobre a conveniência de abreviar-se  o ajuste do Tratado ao exame do Legislativo brasileiro.

Em correspondência ao Barão do Rio Branco, o Embaixador Assis Brasil expressara-se textualmente:” Aproveito o fato de lhe estar escrevendo privadamente para submeter a V.Exª uma cogitação que muito me tem ocupado relativamente ao Acre. Espero que V.Exª estará firme na resolução de não mais deixar esse território sair do nosso domínio. Vai, porém entregá-lo à discutível competência da politicagem do Amazonas ou do Mato Grosso? Por que não usa do seu grande prestígio nacional para promover a reforma que estabelece o regime dos territórios? Seria uma bênção para o País. Como acabar por outro modo com as imoralidades do Amazonas, por exemplo, que ainda neste momento está procurando hipotecer aos agiotas mais direitos soberanos que a Bolívia quis dar ao Sindicato do Acre? E que melhor campeão teriam esses ricos territórios que o herói incruento que os conquistou para o patrimônio nacional?”

Os revolucionários acreanos também fizeram sistemática oposição à ideia dos políticos de Manaus de anexar o Acre ao Amazonas, apropriando-se todos das palavras de Plácido de Castro de que “o Acre não será agrilhoado à triste sorte do Amazonas, porque nós, acreanos, não queremos”.

Ao  fundamentar justificativas ante aos mais virulentos ataques da oposição política, Barão do Rio Branco empenhara-se em revelar inúmeros precedentes históricos de cessões, permutas e vendas de territórios, levados a efeitos mundo afora, celebrados por potências europeias, tornando-se prática usual estendida ao Novo Mundo, a exemplo de vários tratados celebrados pela República dos Estados Unidos da América, que conseguiu adquirir, por compra, a maior parte do território que hoje possui.

A título de exemplo, Barão do Rio Branco citara o Tratado de Paris,de 30.04.1803 durante a presidência de Thomas Jefferson, estipulando a venda aos EE.UU., pelo governo de Napoleão Bonaparte, da Luisiana, cuja população branca era totalmente de origem francesa.

Durante o governo de James Moore, através do Tratado de 22.02.1819, os EE.UU. adquiriram a Flórida Oriental e a Flórida Ocidental. Inúmeros outros Presidentes americanos, a seguir, tais como James Polk, em 1846, Franklin Pierce, em 1853, Andrew Johnson, em 1867, Mackinley através do Tratado de Paz, com a Espanha, em 1898, promoveram a celebração de Tratados, a fim de adquirir territórios para anexá-los  à soberania americana.

Para o Barão do Rio Branco e os mais abalizados estudiosos do Direito Internacional, o Tratado de Petrópolis, foi, em linhas gerais, uma consequência jurídica do Tratado de Ayacucho, de 1867, o qual estipulava que a execução daquele acordo dependia da demarcação que se mandaria proceder conjuntamente, o que nunca ocorrera, por displicência do governo brasileiro.

E em 17 de novembro de 1903, seria finalmente assinado o Tratado de Petrópolis, considerado um importante tratado internacional, pondo  fim às lutas que somente extinguiram-se graças à bravura dos acreanos, ao espírito guerreiro do coronel José Plácido de Castro e à proficiência do ministro plenipotenciário brasileiro José Maria da Silva Paranhos.

Plácido de Castro e Barão do Rio Branco, completam-se na História do Acre. Enquanto este  foi o amparo jurídico dos heróis acreanos, numa ânsia generosa de reparação e justiça, que lhes eram devidas, aquele foi o combatente sem trégua, o auxiliar primacial da grande conquista nacional.

O Brasil deve a Plácido de Castro e ao Barão do Rio Branco, a incorporação do território acreano ao patrimônio Nacional.

Com efeito, torna-se justo todo acreano ufanar-se com o pacto entre brasileiros e bolivianos, no qual não houve vencedores nem vencidos, mas a remoção, para sempre, de dificuldades e complicações, culminando com a conciliação de interesses bem entendidos, não obstante o derramamento de sangue, de dois irmãos vizinhos e amigos.

Um tributo ao Tratado de Petrópolis!

Uma homenagem ao  17 de Novembro!

 

 

 

terça-feira, 13 de novembro de 2012


BRASILEIRO POR OPÇÃO-XXII

                    José Augusto de Castro e Costa

 

Plácido de Castro, ao longo do mês de abril de 1903, passara a sentir-se incomodado ante as notícias de estranhos acontecimentos que vinham-se seguindo, o que, por certo, agravariam a conotação de seus maus pressentimentos.

Toda espécie de picuinhas e perseguições o Caudilho vira mover-se contra ele, oriundas de alguns de seus próprios patrícios e de graduados  militares do Batalhão do Exército.

Numa tarde da primeira quinzena de maio, ao chegar ao seringal “Iracema” com seus fiéis  soldados, Plácido se propusera a tomar, juntamente com os seus companheiros, o destino que a situação excepcional o aconselhasse, convicto, porém, de que “quem se tinha assim sacrificado pela Pátria, jamais se deixaria enxovalhar”.

Plácido de Castro sentira o momento de filosofar sobre as circunstâncias que o Acre passara  a vivenciar, assistindo o  representante militar do governo brasileiro transgredir  os limites da missão que lhe fora traçada, vendo a ocupação do Acre Setentrional  e a invasão do Acre Meridional, sentindo a prisão com brutalidade do ajudante-general  do Exército Acreano e demais soldados, sendo informado da posse violenta e confisco do “Independência” e de milhares de mercadorias, móveis e utensílios...Um turbilhão de fatos negativos aos propósitos do Caudilho tomavam corpo e tumultuavam suas perspectivas.

Precisamente  no dia 12 de maio, Plácido de Castro fora avisado da chegada ao porto do “Iracema”, local em que  se  encontrava no momento, de uma lancha do Quartel-General  do exército brasileiro, trazendo um emissário que viera convocá-lo para uma conferência com o General Olímpio da Silveira.

Plácido, com inabalável solicitude, respondera, mandando dizer ao General que a tal conferência não teria  mais sentido, em face de haver decidido que, a partir daquele momento, sua carreira militar e política estaria encerrada, com sua forçada deposição. Portanto, de posse da convocação do General, não aceitaria a conferência e nem se deixaria desfeitear.

Após a partida da lancha do Quartel-General, o Caudilho  recolhera-se para redigir a Ordem do Dia, com a qual, dirigindo-se aos que tiveram a nobreza para enfrentar todos os sofrimentos com constância e altivez, relatara os últimos acontecimentos vivenciados desde a chegada do Exército Nacional e deliberara dissolver o Exército Acreano, encerrando o expediente  com a afirmação de que “aquilo que o inimigo não conseguiu fazer pelas armas, o general brasileiro alcançou pela traição.

E os nossos algozes são aqueles que oficialmente estão incumbidos de zelar pela nossa liberdade e pela honra da Pátria”.

Ao redigir a Ordem do Dia, Plácido refletira que bem poderia resistir àquela perturbação desenfreada, àquela anarquia que somente se justificaria pela insanidade, pela prepotência, pelo desequilíbrio emocional.

O bom senso e equilíbrio do Caudilho, porém, o detiveram de uma reação violenta contra as forças de sua própria pátria, conduta que o conduzira a protestar contra o atentado inominável e retirar-se altivamente do território, para levar, pessoalmente, suas reclamações ao governo federal. E assim o fizera.

Com a divulgação dos recentes acontecimentos e graça a essa providencia, Plácido fora nacionalmente aclamado, em delirantes manifestações de reconhecimento e entusiasmo patriótico, tanto em Manaus quanto no Rio de Janeiro. Por extensão, o governo federal  acolhera-o condignamente, oferecendo-lhe completas satisfações e determinando seu retorno para o Acre Meridional, em caráter oficial.

Em consequência das tresloucadas atitudes, o general Olímpio da Silveira sofrera demissão e fora severamente censurado  “pela autoria do delito de assaltar uma praça de guerra livre, onde o Brasil não tinha soberania e sim intervenção diplomática”.

Para substituir o autoritário e desequilibrado oficial, fora nomeado o Coronel Rafael Augusto da Cunha Matos, a quem foram transmitidas ordens terminantes de, em Ordem do Dia, protestar “contra o ato inoportuno e impolítico de seu antecessor”, e  de reparar tudo, inclusive a reorganização do exército acreano desbaratado.

Após aguardar o desenrolar dos acontecimentos em Manaus, onde permanecera por três meses, Plácido de Castro conferenciara  com o novo Comandante do 1º Distrito Militar de Manaus, general Luis Antonio de Medeiros, ocasião em que tomara conhecimento e entrosara-se com o esquema da nova  política brasileira, ênfase do programa de governo  do  Presidente Rodrigues Alves.

O Caudilho da revolução acreana sentira bastante com a humilhação sofrida na desavença com o general-comandante da Expedição Norte, razão pela qual confiara na reparação que os telegramas recebidos do Ministério do Exterior lhe anunciavam.

Durante os contatos mantidos com as autoridades militares sediadas em Manaus, o chefe revolucionário acreano inteirara-se do desenrolar dos últimos acontecimentos relacionados à região acreana e, enfim  prestigiado, sentira-se glorificado e de alma lavada e enlevada  com  a publicação do Decreto nº 1, do Comando Militar Interino do Acre Setentrional  e  Comando em Chefe das Forças de Ocupação, nos seguintes termos:

 

 

“Governo Militar Interino do Acre Setentrional e Comando em Chefe das Forças de Ocupação. Quartel-General na Praça da Empresa, 3 de agosto de 1903.

DECRETO N° 1

O coronel Rafael Augusto da Cunha Matos, governador Militar e comandante-em chefe,

CONSIDERANDO que o ato do seu ilustre antecessor, o General-de-Divisão Antonio Olímpio da Silveira, desarmando e licenciando as forças acreanas que sob o comando do Sr. Coronel Plácido de Castro ocupavam militarmente o Território Meridional, foi antipolítico, menos conveniente e inoportuno;

CONSIDERANDO também que a apreensão de artigos bélicos, material flutuante e gêneros alimentícios pertencentes às mesmas Forças que os adquiriram com os sacrifícios de preciosas vidas de centenas de valentes brasileiros tombados em mais de uma ação de combates travados em defesa do solo nacional, foi indevida;

CONSIDERANDO finalmente que não podem nem devem continuar de pé as aludidas deliberações,

RESOLVE:

Chamar às armas as Forças dissolvidas que deverão as apresentar aos respectivos chefes. Restituir às mesmas Forças o que indevidamente foi apreendido e finalmente, reconhecer e manter no governo do Território Meridional do Acre e no Comando em Chefe das mesmas Forças Acreanas, o Sr. Coronel Plácido de Castro.

                                                           Rafael Augusto da Cunha Matos

                                                                       Coronel Governador.

Em face da campanha acreana, Plácido de Castro encontrara a prova de reconhecimento dos brasileiros, vindo através de manifestações generalizadas das classes conservadoras, da Imprensa, das Forças Armadas, do governo, do clero, do povo, destacando-se discursos inflamados de entusiasmo em festa cívica no Teatro Amazonas, estendendo-se até a sermão solene em Missa campal.

No final  de agosto de 1903 o Caudilho, certificado pelo novo comandante local acerca da  indenização dos prejuízos causados pela captura dos bens materiais e provisões de sua força revolucionária e, ainda, recuperado de todos os seus títulos e prerrogativas, retornara  à região acreana, oficialmente, na qualidade de governador do Acre Meridional - ou do Estado Independente do Acre.

O  panorama político tranquilizara-se porque o Brasil, com a posse do novo presidente Rodrigues Alves, passara a adotar uma avançada mentalidade em  seu programa de governo, instaurando uma política destinada a fomentar o pleno desenvolvimento de todas as potencialidades do país, tais como a balança comercial, os meios de transportes, a saúde, a educação, a transformação do velho Rio de Janeiro numa das mais belas metrópoles  do continente e também a diplomacia, onde se destacaria a figura de José Maria da Silva Paranhos – Barão do Rio Branco.

Aos cinquenta e oito anos de idade, o Barão do Rio Branco já acumulara em sua bagagem, uma inestimável folha de serviços prestados diretamente à diplomacia brasileira, onde destacaram-se o desempenho rotineiro de suas funções pacíficas exercidas nos movimentados postos dos Continentes americano e europeu, até a admirável habilidade para vencer as encrencadas complicações de Missões, no Rio Grande do Sul e do Amapá, no extremo  norte do Brasil.

 

 

 

 

 

 

 

 

segunda-feira, 5 de novembro de 2012


 B0   RASILEIRO POR OPÇÃO-XXI

                  José Augusto de Castro e Costa

A revolução acreana tornara-se finalmente vitoriosa com a rendição de Puerto Alonso, em 24 de janeiro de 1903.

Entretanto, dias depois os acreanos tomaram ciência de que, naquele mesmo período, partira de La Paz com destino a Puerto Rico o general Pando, presidente da Bolívia, e seu Ministro da Guerra, Ismael Montes, à frente de duas colunas do exército, para tentar a dominação do insurreto território que, afinal, deveria ser arrendado ao sindicato americano Bolyvian Syndicate, que exerceria ali poderes majestáticos.

Plácido tomara as providências de mandar parte de sua tropa para Puerto Rico,  para empreender operações de reconhecimento e sondagem do potencial inimigo, a fim de tentar o sítio da praça boliviana e deter o propósito da alta cúpula invasora.

 Já em Xapuri, enquanto preparava-se para  partir a fim de enfrentar as colunas do exército boliviano, no transcurso do mês de fevereiro de 1903, Plácido tomara ciência de que o governo brasileiro ordenara a ocupação do Acre Setentrional, ao norte do paralelo 10°20’, fato que já estaria em andamento, com a previsão de chegada, em breve, de um considerado Batalhão do Exército brasileiro.

Surpreendido com a notícia, o Caudilho entregara ao seu substituto o comando da tropa acreana que enfrentaria o novo ataque boliviano e retornara apressadamente a Porto Acre, a fim de aguardar e recepcionar a chegada do comandante oficial brasileiro, general Olímpio da Silveira, o que ocorrera a 3 de abril de 1903, em clima aparentemente amistoso,  não obstante a brevidade do encontro, o diálogo reticente  e as reservas  do visitante percebidos no  encontro.

Demorando-se menos de uma hora em enigmática visita, o militar despedira-se vagamente, para continuar viagem rio Acre acima, deixando com o chefe revolucionário acreano apenas alguns jornais e imprecisas suposições.

A 10 de abril, o tom da incerteza  anuviara-se um pouco mais quando Plácido de Castro recebera  um ofício do general Olimpio da Silveira, comunicando-lhe que, por determinação do Governo Federal, passara a ocupar militarmente e assumira o governo  do norte do território acreano, correspondente ao paralelo 10°20’.

O Caudilho, então, fingindo não compreender o quanto aquele ato ofendia a sua autoridade, contudo, considerando o dever de patriotismo não embaraçar as medidas do governo brasileiro e reivindicando os direitos conspurcados pelo governo boliviano, resolvera, por decreto, transferir para Xapurí, a sede do Governo do Estado Independente do Acre, assim como a Alfândega do Estado para “Capatará”, seringal que, cinco anos depois, adquirido por compra, em sociedade com seu irmão, viria a ser sua propriedade particular.

Xapurí  era, por essa época, uma próspera e pitoresca cidade, de casas de madeira cobertas de zinco, construídas em um barranco alto, em frente à foz do rio Xapurí, servindo de empório ao comércio desse rio e do Alto Acre.

De passagem pela “Empresa”, Plácido conferenciara com o general brasileiro, acerca da recente invasão boliviana, sob o comando do presidente Pando, todavia, sem a menor referência  ao objetivo da presença do exército brasileiro na região.

Encerrada a conversa Plácido retomara a viagem rio acima, para reencontrar a guarnição acreana Xapurí e seguir para Puerto Rico, que logo seria sitiado com as forças antes enviadas pelo comandante revolucionário.

Nos últimos dias de abril fora  travado  um intenso combate,  após  o qual, depois de quatro dias de batalha cerrada, as forças bolivianas começaram a dar sinal de debilitação.

Enquanto Plácido de Castro, em plena luta, considerava iminente o momento da rendição do poderoso inimigo, chegara, procedente de “Empresa”, o major brasileiro Gomes de Castro, trazendo-lhe um ofício do General Olímpio da Silveira, comunicando  que fora assinado, pelo Governo Federal, o documento denominado “modus vivendi”, entre o Brasil e a Bolívia.

Plácido acatara a providência contida no documento e no momento em que preparara-se para retransmiti-la aos bolivianos, fora surpreendido com a bandeira branca que o general-presidente José Manuel Pando mandara hastear, em face de também haver recebido a comunicação do “modus vivendi’, estabelecido  por instrumento datado de 21 de março de 1903.

Logo a seguir, Plácido tomara conhecimento, através do alferes Azevedo Costa, também do exército de ocupação da “Empresa”, de um ofício do general Olímpio da Silveira para o presidente Pando, propondo uma conferência direta com o boliviano, a realizar-se dentro de três dias, o que, na realidade,  jamais ocorrera.

Plácido de Castro resolvera, então, retornar ao Acre para falar ao general Olímpio, o que fizera cavalgando o mais rápido possível. No trajeto, defrontara-se com situações, de certa forma intrigantes.

Em princípio, no caminho de regresso, o Caudilho encontrara um oficial boliviano que, passando pelos acampamentos acreanos, dirigira-se a “Porto Rico”. Perguntado por Plácido com que licença um boliviano atravessara um caminho estratégico que acabara de ser aberto, um oficial acreano que o acompanhava respondera que o fazia com ordem do general Olimpio.

Ao chegar ao alto Acre, não encontrando o general Olimpio, Plácido retornara para providenciar  mantimentos para as tropas que encontravam-se  lutando no Tauamano, já sofrendo  com a fome, que  começara a ser sentida.

Com respeito, o Caudilho dera ordens ao ajudante-general do exército acreano que fizesse reunir os muares existentes na vizinhança e os enviasse com víveres para as tropas acreanas.

Um proprietário recusara-se a cumprir estas ordens, já influenciado  pelos oficiais do general Olímpio, que também estariam estimulando os soldados de Plácido à desobediência.

Plácido mandara prender o tal proprietário e recolhê-lo à guarda da força.  Os oficiais do Batalhão do Exército brasileiro, sob o comando do major Carneiro,ao tomar conhecimento do fato, foram libertar o preso, o qual aproveitara a confusão  para evadir-se.

Segundo Plácido de Castro registrara em seus apontamentos, alguns soldados acreanos, feridos pela indisciplina que lhes sugeriram os oficiais do Exército, passaram a dividir-se.

Uma parte deles continuara a acatar as ordens dos oficiais acreanos, enquanto outra parte passara para o acampamento do 27° Batalhão do Exército, cujo comandante oficiara ao general Olímpio, relatando os acontecimentos da maneira que lhe conviera.

Os moradores do Acre amavam sinceramente a terra que descobriram, povoaram e defenderam do domínio estrangeiro, com sacrifício de inúmeras vidas.

Meio esquecidos do distante torrão, do qual raríssimas notícias recebiam, cearenses, amazonenses, maranhenses, pernambucanos, gaúchos,independentemente de quaisquer comandos, todos sentiam-se na verdade acreanos de coração, empolgados que estavam pela luta ingente na terra grandiosa e bravia.

Por estranho que pareça, era e é fato real que a vida no Acre sempre absorvera e empolgara o espírito dos fortes, que ali demoram, apagando-lhes as saudades da terra distante e dando-lhes ânimo de permanência e fixação.

Porém, as perspectivas pareciam trazer ao Caudilho e a seus fiéis companheiros a sensação de que  estava  sendo lançada a semente da cizânia a qual, regada ao ópio da cobiça de poder e glória, e utilizando-se da inveja, vaidade e ignorância de algumas pessoas, não demoraria muito, iria brotar o fruto do sofisma corruptível que vemos habitar períodos nebulosos, desde os primórdios, da história brasileira.